EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 87/15 Um breve comentário.

O inciso VIII do § 2º do art. 155 da Constituição Federal determinava que, o Estado de destino da mercadoria ou serviço somente faria jus à parcela do ICMS incidente sobre a operação e prestação interestadual se o destinatário consumidor final se apresentasse como contribuinte do imposto, e assim deveria recolher ao Estado de sua localização, a diferença entre as alíquotas interestadual e interna vigente neste território de destino (o famoso DIFAL).

Em substituição a essa alternativa, foi editada a Emenda Constitucional 87/15 que trás no seu bojo uma pequena, digamos "revolução", no sistema de repartição das receitas do ICMS relativamente às operações interestaduais destinadas a consumidor final, seja ele contribuinte ou não do imposto.

A E.C. 87/15 que começa a vigorar em 01/01/2016 tem a seguinte redação:

"VII - nas operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final, contribuinte ou não do imposto, localizado em outro Estado, adotar-se-á a alíquota interestadual e caberá ao Estado de localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna do Estado destinatário e a alíquota interestadual."

Embora a intenção do legislador fosse, inicialmente, regular o mercador do e-commecer (vendas pela internet interestadual), na opinião de vários doutrinadores e comentaristas tributários (onde me incluo), da forma como foi redigido o dispositivo constitucional, todas as operações interestaduais, sejam elas presenciais ou não presenciais (internet) serão atingidas. Isto porque, a E.C. não excluiu as aquisições presenciais, exigindo apenas que o destinatário esteja "localizado em outro Estado". Dessa forma, pode-se inferir que, até mesmo nas compras de uma pessoa em visita a outro Estado, será devida a diferença de alíquota, basta que esta pessoa indique que sua residência é em outra Unidade da Federação.

Portanto, em toda e qualquer operação interestadual com mercadorias para uso ou consumo, de pessoa física ou jurídica, o imposto será integral, ou seja, a carga será correspondente à alíquota interna do Estado de destino, ficando uma parte (alíquota interestadual) com o Estado onde se localiza o vendedor e outra parte (diferença de alíquota) com o Estado onde se localiza o adquirente.

Num outro giro, acreditamos que a inusitada E.C., de quebra, põe fim a eterna discussão relativa à questão das empresas de construção civil, que, agora, não poderão mais arguir a qualidade de não contribuintes do imposto para deixar de pagar o diferencial de alíquota (DIFAL), uma vez que a nova regra atinge a todos, contribuintes e não contribuintes do ICMS.

Vamos imaginar algumas situações que poderão ocorrer, a partir de janeiro de 2016, quando entrará em vigor o novo sistema.

1. Operação destinada a consumidor final contribuinte do imposto:

Uma empresa localizada no Amapá adquire produtos para uso e consumo no Estado do Pará, no valor de R$ 1.000,00. Neste caso, sendo o adquirente contribuinte do imposto, o fornecedor (vendedor paraense) emitirá NFe com alíquota interestadual de 12%, gerando um imposto no valor de R$ 120,00, devido ao Estado do Pará, ficando o adquirente responsável pelo pagamento da diferença de alíquota devida aos cofres do Estado do Amapá no valor de R$ 50,00 (5% sobre R$ 1.000,00), que correspondente à diferença entre a alíquota interna (17%) e a interestadual (12%), conforme determina a legislação do Amapá.

2. Operação destinada a consumidor final não contribuinte do imposto (pessoa física ou jurídica):

Considerando que a interpretação da E.C. seja a mais ampla, como exposto acima, podemos imaginar a seguinte situação: um cidadão com endereço no Estado do Amapá vai a Pernambuco e adquire mercadorias num loja de departamento em Recife no valor de R$ 1.000,00. O cidadão informa ao vendedor que mora em Macapá. Neste caso, sendo o adquirente pessoa física (não contribuinte do imposto), o fornecedor (vendedor pernambucano) emitirá a NFe informando tratar-se de "operação interestadual", gerando um imposto no valor de R$ 120,00, devido ao Estado de Pernambuco, correspondente a 12% (operação interestadual), e deverá ainda calcular ainda o valor do imposto devido ao Estado do Amapá, que será igual a R$ 50,00, correspondente a 5%, que é a diferença entre a alíquota interna (17%) e a interestadual (12%).

No entanto, a E.C. 87/15 determina que, em 2016, somente 40% do valor devido como diferencial de alíquota será repassado ao Amapá, ou seja, o vendedor repassará para o Amapá apenas R$ 20,00 (40% de R$ 50,00), e os outros R$ 30,00 deverá recolher ao Estado de Pernambuco. Em resumo, nesta operação, no ano de 2016 o vendedor pernambucano recolherá R$ 150,00 (R$ 120,00 + R$ 30,00) para o Estado de Pernambuco e R$ 20,00 para o Estado do Amapá. Observe que, no final, a carga tributária sobre o produto vendido foi de 17% (R$ 170,00).

3. Operações realizadas por empresas de construção civil.

Uma das situações mais polêmicas do ICMS nas operações interestaduais é a que envolve as empresas de construção civil. Várias fórmulas foram tentadas pelos Estados para tributar as operações interestaduais dessas empresas, mas, elas sempre recorriam ao judiciário alegando não serem contribuintes do ICMS, e por isso não estariam sujeitas ao pagamento da diferença de alíquotas. E nesse sentido, o próprio STJ chegou a formular a seguinte súmula:

Súmula 432: As empresas de construção civil não estão obrigadas a pagar ICMS sobre mercadorias adquiridas como insumos em operações interestaduais.

Entretanto, com a nova regra contida na E.C. 87/15, as construtoras não poderão mais arguir que não são contribuintes do ICMS para escapar do DIFAL, posto que, agora essa diferença será devida em qualquer operação interestadual, seja ela promovida por contribuinte ou não contribuinte do imposto, conforme esclarecemos acima.

Por fim, é importante destacar que, essa mudança somente será possível porque hoje, as operações comerciais são acobertadas pela Nota Fiscal Eletrônica (NF-e), que permite o acesso imediato da informação. Com o advento da NF-e é possível aos Fiscos estaduais conhecer, quase em tempo real "todas" as operações destinadas aos seus territórios. Por exemplo, o Amapá tem acesso ao banco de notas fiscais eletrônicas emitidas e destinadas ao Estado, mantendo com isso o controle de todas as compras realizadas pelos contribuintes e não contribuintes localizados no Amapá. Sendo assim, será perfeitamente possível ao Fisco amapaense identificar as compras interestaduais realizadas por qualquer pessoa localizada em nosso Estado.

Talvez, seja oportuno incentivar as pessoas a identificarem seus domicílios quando efetuarem compras em viagens a outros Estados brasileiros, pois, poderão assim, contribuir para o aumento da arrecadação do Estado.

Por evidente que, somente a prática vai ajustar as diversas dificuldades de operacionalização dessa nova forma de tributação nas operações interestaduais, bem como vai gerar ainda muitas discussões e interpretações diversas. 

Macapá, 17 de agosto de 2015

Antonio Dantas